Mais um dia se passa e parece que estamos vivendo num circo de horrores.
A população, que antes esbravejava contra crimes de responsabilidade
fiscal, agora mal se manifesta contra a corrupção passiva de um
presidente no exercício do mandato. Por mais que a rejeição ao governo
ultrapasse, com folga, os 95%, nos mais variados institutos de pesquisa
do país, o silêncio nas ruas é ensurdecedor.
A precarização das leis trabalhistas já passou, a reforma da Previdência
está em discussão, a segunda denúncia contra o presidente foi
arquivada, a carreira do servidor público está sob ameaça, a educação e a
saúde pedem socorro, o trabalho escravo quase foi regulamentado – por
hora a portaria foi suspensa – mas o que realmente parece importar são
as "pedaladas fiscais".
Não é julgar quem está mais ou menos errado. É julgar. Pau que bate em
Chico também deve bater em Francisco. Adotar dois pesos e duas medidas
só abre precedentes para fazer o povo ainda mais de palhaço.
A consciência política da população parece ter mudado, mas ao mesmo
tempo que a gente vê a mobilização para destituir uma presidenta eleita,
os movimentos sociais não parecem ter força suficiente para arrebanhar a
parcela da sociedade que não está engajada na discussão.
É inegável que o financiamento, por parte do empresariado, das
mega-manifestações que aconteceram em todo o país também influenciou no
número de pessoas que foram às ruas. Jamais as centrais sindicais terão
recurso suficiente em caixa para bater o dinheiro investido pelo
agronegócio e pela FIESP.
Análises de jornalistas estrangeiros fazem a mesma pergunta que eu: Como
um presidente acusado de corrupção, com a popularidade quase zero,
ainda está governando o nosso país?
Infelizmente, pelo espetáculo todo que vimos, nem precisa ser gênio para
saber que o mercado financeiro não liga para a corrupção; Temer tem
orçamento suficiente para subornar a Câmara e o Senado; e os protestos
do ano passado ditos "anti-corrupção" eram contra a Dilma e não contra a
corrupção.
Estamos no meio de um furacão e vendo a História do nosso Brasil ser
escrita por aqueles que são algozes por dinheiro e mal pensam no
bem-estar da população que os elegeram. Daqui menos de uma década
veremos o quanto fomos feitos de trouxa, manipulados e utilizados como
massa de manobra para perpetuar uma direita ultraconservadora no poder. E
o pior, não precisaremos ser pesquisadores ou cientistas políticos para
analisar esse período.
Evertom Almeida é Gestor Público, especialista em Gestão de Cidades e
coordenador geral do SINASEFE-MT (sindicato dos professores e
técnicos-administrativos do IFMT)
Um ponto de ônibus localizado na Rua Marechal Deodoro, na região
central de Cuiabá, passou por uma transformação durante um projeto de
incentivo à leitura dos usuários do transporte público coletivo da
capital. O ponto de ônibus recebeu prateleiras com livros como parte do
projeto Parada Cultural, para transformar o local em uma biblioteca 24
horas à disposição da população. Quem passou pelo ponto de ônibus nesta
quarta-feira (24) pôde pegar livros gratuitamente para lê-los no local
ou, até mesmo, levá-los para casa.
A iniciativa de transformar o ponto de ônibus em local de acesso a
livros é do servidor Evertom Almeida, do Instituto Federal de Mato
Grosso (IFMT). Ele conta que a ideia surgiu ao passar por um bairro em
Brasília onde os pontos de ônibus têm livros à disposição dos usuários
do transporte coletivo. De volta a Cuiabá, ele decidiu implantar o
projeto, ainda em fase experimental, no ponto de ônibus que está
localizado justamente atrás do campus do IFMT no centro da cidade. “A
meta é ampliar o projeto para bairros carentes, trazendo a comunidade
para participar e cuidar desse patrimônio que todos vão utilizar”,
destacou Evertom ao G1.
Para realizar as modificações no ponto de ônibus, o autor do projeto
solicitou autorização e permissão da Secretaria Municipal de Trânsito e
Transporte Urbano de Cuiabá (SMTU). As adequações do local, como pintura
e implantação da prateleira, foram feitas em uma semana. Para a
arrecadação dos 350 livros foi realizada uma campanha nas redes sociais.
“Recebemos doações de diversos pontos da cidade, como CPA e até mesmo
Várzea Grande (região metropolitana). Eu mesmo me dispus a buscar os
livros. Era só a pessoa agendar o horário e passar o endereço”, lembrou o
servidor público. A biblioteca foi “inaugurada” nesta quarta-feira.
Nos primeiros 15 dias de implantação da biblioteca, nos horários de
pico, o idealizador e mais dois bolsistas do IFMT estarão no local
explicando o projeto para a população e também recebendo as doações de
novos títulos. Para as pessoas que passarem em outros horários pelo
local, foram deixados marcadores de página dentro dos livros com
explicações sobre como funciona o projeto.
Para realizar os empréstimos dos livros, não existe burocracia. Quem se
interessar por um título, pode levá-lo para casa sem precisar preencher
ficha nem se identificar. “Para muitos, uma utopia. Para outros tantos,
uma loucura. Mas observamos ser muito mais que um simples projeto
colocado em prática. Observamos ser um exercício de cidadania” disse
Evertom ao G1.
Ele ressaltou que as pessoas interessadas em doar livros para a
biblioteca podem procurar o campus do IFMT em Cuiabá ou deixar as obras
nas prateleiras do ponto de ônibus. Nos primeiros dias, Evertom estará
no local nos horários de maior movimentação de usuários para receber as
doações. Ele disse que não há restrição para a doação de títulos.
Seja no
basquete, no break, no futebol de rua ou no processo de aguçar o senso crítico
da juventude o importante é a garantia e manutenção de todos os direitos
fundamentais inerentes ao ser humano, todas as oportunidades e facilidades, a
fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e
social, em condições de liberdade e de dignidade. Para isso o Projeto Arte, Cultura e Esportes nas Escolas tem a
intenção de ser um instrumento de sensibilização social aos jovens, evitando o
isolamento e amenizando a situação de vulnerabilidade as drogas através do
oferecimento de eventos culturais e esportivos.
O Projeto adotou a Escola Estadual Estevão Alves Corrêa, localizada no bairro Tijucal - Cuiabá para desenvolver as respectivas atividades, as quais tiveram grande participação dos alunos e apoio incondicional por parte da direção escolar. No primeiro bate papo com os estudantes da escola sobre o projeto, convidamos a professora socióloga e chefe do departamento de apoio ao estudante do IFMT, Christiany Fonseca para que fizesse uma retrospectiva sobre os movimentos sociais e estudantil e falar da relação institucional entre Grêmio Estudantil e Direção Escolar, logo em seguida o aluno de eletrônica do IFMT e bolsista do projeto, Juarez França apresentou de forma detalhada o projeto para a comunidade escolar.
Diante de um processo democrático que visa eleger a próxima Gestão Sindical dos servidores públicos federais do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso me junto ao grupo União e Compromisso e volto a empunhar a bandeira da Educação Pública de Qualidade. Com uma visão social mais apurada sobre o processo trago na bagagem uma maior convicção da necessidade de lutarmos pela defesa e fortalecimento da Educação.
Defendo uma Gestão Sindical unitária para lutar por todos os nossos direitos e que represente todos os servidores. Existe sim, a necessidade de ser sensível à causa e não nos curvarmos diante da máquina opressora para que possamos de fato garantir o direito de lutar por melhorias e buscar o sentimento de representação da classe. Nem por isso devemos fragmentar nosso instrumento de luta, devemos sim, quando estivermos na luta, nos lembrar de quem é o nosso verdadeiro inimigo. O sindicato é para lutar e acredito que a partir dessa manifestação pública poderemos consolidar de forma transparente e coletiva uma gestão com a responsabilidade ainda maior, pois existe a possibilidade de prosseguirmos este trabalho. E também de reinventar o trabalho, pois não há contradição em seguir e seguir mudando, amadurecendo ideias e equipe.
Defendo a gestão compartilhada, com posição firme de luta! Devemos fortalecer a classe, instigá-los para o debate e para luta para que enfim possamos de fato representar plenamente os interesses de nossos companheiros, tanto do corpo docente como do corpo técnico, pois no final, somos todos defensores de uma educação pública, de qualidade e a serviço da população!
Ativistas do Greenpeace pesquisaram a situação de cada capital do país Imagem:Divulgação
Em janeiro de 2012, o governo instituiu umaleique determina que os municípios com mais de 20 mil habitantes devem elaborar um Plano de Mobilidade Urbana (PMU). Caso não cumpram a regra em um prazo máximo de três anos, as cidades não poderão receber do governo federal recursos financeiros destinados a mobilidade urbana.
Para motivar o envolvimento da população na questão, os ativistas do Greenpeace lançaram a campanhaCadê o Plano de Mobilidade?. Eles criaram umportalque apresenta o panorama da situação do PMU de todas as capitais brasileiras e que alerta para a importância da elaboração de um bom plano de mobilidade urbana.
Os paulistanos levam cerca de 43 minutos por dia no percurso casa-trabalho, o que equivaleria ao gasto de 13 dias do ano com o trânsito
Os paulistanos, por exemplo, levam cerca de 43 minutos por dia no percurso casa-trabalho, o que equivaleria ao gasto de 13 dias do ano com o trânsito, de acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
E as consequências não param por aí. A questão da mobilidade urbana tem a ver também com as mudanças climáticas, já que o setor de transporte representa um quarto do total de consumo de energia mundial. O último inventário brasileiro de emissões de gases de efeito estufa (GEE) mostra o setor como o segundo maior emissor do país.
Segundo o Greenpeace, as pessoas também devem cobrar investimentos em estrutura urbana e transporte coletivo e não motorizado, como ciclovias, bicicletários e calçadas.
Quatorze capitais brasileiras estão com a elaboração do PMU em processo, entre elas estão São Paulo, Curitiba, Porto Alegre e Recife. Conheça as cidades que já apresentaram o plano e saiba as que não o iniciaram ainda:
Belo Horizonte:As obras mencionadas no plano apresentado já estão sendo realizadas. Segundo o Greenpeace, atualmente a prefeitura está empreendendo esforços para institucionalizar o plano.
Cuiabá:O plano foi elaborado com foco na Copa 2014, mas considera o desenvolvimento da região até 2030 e também busca ordenar o transporte urbano nos pós-Copa.
Porto Velho:A prefeitura apresentou o plano de mobilidade urbana, porém, ele ainda está sendo revisado.
Rio Branco:O plano foi desenvolvido entre 2006 e 2009, dedicando maior tempo à realização de pesquisas. Atualmente, a prefeitura pretende fazer uma avaliação do que foi executado, com o objetivo de adequar o plano a um conceito mais forte de mobilidade e à Política Nacional. A revisão ainda não foi iniciada, a jutificativa é a mudança de gestores. A previsão do início dos trabalhos é ainda em abril.
Rio de Janeiro:O Plano Diretor de Transporte Urbano da Região Metropolitana do Rio de Janeiro (PDTU) foi elaborado em 2005 e está sendo revisado com base nos horizontes de 2016 e 2021. O término da revisão está previsto para junho/2013.
Salvador:O plano elaborado com o Estado trata da mobilidade na região metropolitana e já foi apresentado preliminarmente ao Ministério das Cidades. Porém, não há previsão de quando será revisado.
Teresina:O plano precisa ser revisado para adequação à Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), no entanto essa adequação só poderá ser realizada quando a revisão do plano diretor for concluída (previsão para 2013) e as novas premissas e diretrizes municipais traçadas.
Vitória:Utilizam o Plano de Mobilidade Urbano Metropolitano elaborado pelo Estado, que foi concluído e apresentado à população no final do de 2012.
Belém:Sem previsão.
Fortaleza:Previsão de iniciar a elaboração do plano ainda em 2013.
"Educação Integral: Crer e Fazer" é o tema desta edição; devem concorrer projetos que estimulem ações inovadoras em comunidades; grande vencedor deverá receber R$ 225 mil
Organizações não-governamentais de todo o Brasil podem se inscrever na 10ª edição do Prêmio Itaú-Unicef. Nesta semana, várias capitais do país recebem o lançamento oficial do prêmio, começando por Belém, nesta terça-feira.
Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância, Unicef, o objetivo é incentivar ONGs que contribuam para a aprendizagem de crianças e adolescentes de comunidades.
Dança e Rádio
De Brasília, Júlia Ribeiro, do programa de educação do Unicef, explicou à Rádio ONU que podem concorrer projetos ligados ao desenvolvimento integral dos menores.
"Quando a gente pensa no desenvolvimento integral, a gente pensa em atividades ligadas às artes, à música, aos esportes, à cultura, à dança, atividades de rádio. São diversos tipos de atividade que buscam promover o desenvolvimento integral, que é aquele que vai além do conhecimento curricular, dos conhecimentos das linguagens matemáticas e escritas."
O tema do prêmio neste ano é: "Educação Integral: Crer e Fazer". As inscrições seguem até o dia 31 de maio. Os projetos serão avaliados por região, em oito polos: São Paulo, Bauru, Belo Horizonte, Goiânia, Belém, Porto Alegre, Salvador e Rio de Janeiro.
Etapas
As ONGs podem inscrever uma ou mais iniciativas socioeducativas que envolvam menores de 6 a 18 anos e que estejam em condições vulneráveis. A seleção será feita em seis etapas, que vai indicar 32 projetos finalistas.
A premiação será em novembro e quatro ONGs de projetos vencedores vão receber R$ 100 mil cada. O Prêmio Itaú-Unicef irá indicar ainda um grande vencedor para receber R$ 225 mil.
Nas
comunidades a serem afetadas pelas usinas no rio Tapajós, entre
angústia e anseios, a desinformação impera, enquanto avançam os planos
para as obras
Por Carlos Juliano Barros
“Morrer
na lama, debaixo d’água, é que é triste, né? Mas, achando um lugar onde
a gente escape para morrer sossegado, quem me acompanha é Deus e meus
filhos”. É humanamente impossível deixar de prestar atenção às palavras
que pausadamente saem da boca de Maria Bibiana da Silva, apelidada de
Gabriela em homenagem ao pai, José Gabriel. Do alto de seus 104 anos,
comprovados pelo rosto profundamente enrugado e pelas pernas arqueadas
em forma de alicate, a profética anciã responde de bate-pronto quando
questionada sobre o que o rio Tapajós representa para ela: “o sossego”.
No
longínquo ano de 1917, Gabriela partiu do Ceará rumo aos seringais do
Acre. No meio do caminho, porém, a família resolveu fincar raízes em
Pimental, uma vila de pescadores erguida na beira das águas esverdeadas
do Tapajós, numa área que hoje pertence ao município de Trairão, no
oeste do Pará. E de lá jamais saíram. Desde aquela remota época, os dias
no modesto povoado onde atualmente vivem cerca de 800 pessoas nunca
foram tão agitados.
Maria Bibiana da Silva, a “Gabriela”, matriarca da Vila Pimental, Trairão (PA) / Foto: Fernanda Ligabue
Pimental
tem uma inegável atmosfera de Macondo, a mítica aldeia ribeirinha que
Gabriel García Márquez construiu na sua obra-prima “Cem anos de
Solidão”. Mas, nesse isolado trecho do Pará, a discórdia não é provocada
pela chegada de uma companhia bananeira, como no livro do premiado
escritor colombiano, e sim pela construção da hidrelétrica de São Luiz
do Tapajós, que pode mandar Pimental inteiro para baixo d’água. “Por
mim, não tenho gosto que essa barragem saia, mas uma andorinha só não
faz verão”, alerta Gabriela, a matriarca da comunidade.
Se
de fato vingar, São Luiz do Tapajós será capaz de gerar até 6.133
Megawatts. No papel, é a quarta maior hidrelétrica do país, atrás apenas
da binacional Itaipu – na fronteira entre Brasil e Paraguai –, de Belo
Monte e de Tucuruí, construídas, respectivamente, nos rios Xingu e
Tocantins, também em território paraense. A usina é a maior de um
complexo de até sete hidrelétricas que o governo federal planeja
construir no Tapajós e no seu afluente Jamanxim. Até o final desta
década, duas usinas devem de fato ser construídas.
Segundo dados preliminares que constam do inventário do potencial hidrelétrico da bacia do Tapajós,exatas
2.352 pessoas de 32 povoados ribeirinhos diferentes serão diretamente
atingidas caso as sete hidrelétricas previstas saiam do papel. O estudo
foi feito em 2008 pela Eletronorte, subsidiária da estatal Eletrobras,
estatal oficialmente responsável pelas obras complexo de usinas.
Movimentos sociais e entidades que assessoram essas comunidades acham
que o número é subestimado.
C.A.K, presidente da associação comunitária da Vila Pimental: povoado em discórdia Foto: Fernanda Ligabue
Prevista
para entrar em operação em dezembro de 2018, a usina de São Luiz do
Tapajós é a que está em fase mais adiantada de licenciamento ambiental. O
plano do governo é licitar a construção da obra até o final de 2013.
Orçado incialmente em R$ 18 bilhões, o empreendimento tem verba
garantida pela segunda edição do Plano de Aceleração do Crescimento
(PAC), vitrine do governo da presidente Dilma Rousseff.
Fundada
há cerca de 120 anos, Pimental é a maior das vilas ribeirinhas que
serão alagadas pelas águas represadas da usina de São Luiz do Tapajós.
Além dos roçados, a maior parte das pessoas ali vive mesmo é da pesca
artesanal. “Nosso freezer é bem aí”, afirma José Odair Pereira Matos, o
C.A.K., presidente da associação comunitária, apontando o dedo para o
Tapajós. “É o rio que mantém o nosso peixe fresco.”
Hoje,
Pimental representa a principal frente de resistência ao paredão de
3.483 metros de comprimento por 39 metros de altura da barragem, que vai
alagar uma área de quase 75 mil campos de futebol. Porém, à medida que
avançam os estudos de viabilidade para construção da usina, cresce
também a cisão entre os moradores.
“Tem
uns que são a favor da usina. Principalmente aqueles que conseguem
empreguinhos de vigia de máquina, de carregador de barra de ferro, de
mateiro para abrir picada na floresta nas empresas que fazem os estudos.
Mas aí eu pergunto: e quando essas empresas forem embora?”, questiona
Edmílson Azevedo, catequista da Igreja Católica.
“Quem
está trabalhando hoje não se dá conta de que isso é temporário. As
empresas criam a expectativa de que as pessoas vão se empregar, mas é
uma ilusão”, analisa Raione Lima, agente da Comissão Pastoral da Terra
(CPT). “Infelizmente, estamos vivendo um momento intenso de conflitos na
comunidade, ribeirinhos contra ribeirinhos.”
Falta de diálogo
Não
é de hoje que o povo de Pimental ouve falar da barragem que pode
inundar a vila por completo. “Aqui já chegou americano, japonês, alemão.
No campo de futebol em frente à igreja já sentaram dois helicópteros”,
conta C.A.K, o presidente da associação comunitária. Técnicos a mando da
Eletrobras e da sua subsidiária Eletronorte rondam a vila há quase uma
década. De três anos para cá, o movimento se intensificou.
“Quando
a gente perguntava o que ia acontecer, para onde a gente ia, eles nunca
respondiam, diziam que não era com eles. Eles queriam fazer primeiro as
pesquisas e depois dizer o que ia acontecer com a gente. Até que um dia
a gente falou: primeiro vocês falam o que vai acontecer com a gente,
quais são os nossos direitos, e depois vocês fazem pesquisa”, conta
C.A.K.
O
momento mais tenso se deu em 2010. Naquele ano, uma firma de topografia
entrou na comunidade sem qualquer tipo de contato prévio e instalou
marcos de concreto no meio da rua, sem fornecer explicações. Indignados,
os moradores de Pimental expulsaram os técnicos responsáveis pelo
serviço, destruíram as instalações e passaram a controlar a entrada de
pessoas estranhas.
Manifestação de ribeirinhos da Vila de Pimental contra a hidrelétrica de São Luiz do Tapajós / Foto: Fernanda Ligabue
A
Eletrobras, porém, precisava entrar de qualquer maneira na vila para
fazer os estudos de viabilidade da usina. A fim de tentar uma
reaproximação, a estatal contratou, então, um grupo batizado de “Diálogo
Tapajós” para cadastrar e prestar esclarecimentos aos moradores dos
povoados ribeirinhos que serão diretamente impactados não só pela usina
de São Luiz do Tapajós, mas também pela hidrelétrica de Jatobá – a
segunda do complexo previsto pelo governo, com previsão para entrar em
operação em abril de 2019.
Num domingo escaldante de outubro, a reportagem da Pública encontrou
quatro profissionais do Diálogo Tapajós em um restaurante caseiro de
Pimental. Na ocasião, o coordenador do grupo se mostrou disposto a
conceder uma entrevista e deixou um encarte distribuído à população
local com um número de celular e o e-mail “contato@dialogotapajos.com.br”.
Toda vez que uma mensagem é enviada para esse correio eletrônico,
gera-se de forma automática um aviso de “falha permanente”. Em outras
palavras, o endereço de e-mail não existe ou enfrenta algum problema
técnico.
Passado o encontro em Pimental, a reportagem da Pública ligou
em diversas oportunidades para o representante do Diálogo Tapajós. Em
algumas vezes, não obteve resposta. Em outras, ouviu a confirmação de
que a entrevista estava de pé, mas que ela deveria ser realizada em
outro momento. Até o fechamento desta matéria, apesar da insistência, a
conversa não foi realizada.
“O
Diálogo Tapajós entrou na comunidade num momento errado e tardio. As
informações tinham que ter chegado antes da entrada das empresas para
fazer as pesquisas”, afirma Raione. “Mas, só a partir do momento em que
se criou a resistência é que chegou o Diálogo”, acrescenta a agente da
CPT.
O
procurador do Ministério Público Federal do Pará (MPF-PA) Felício
Pontes revela preocupação com a possibilidade de a aproximação do
Diálogo Tapajós ser usada indevidamente como uma forma de consulta
prévia às comunidades afetadas pela hidrelétrica. “O problema é utilizar
esse tipo de levantamento como uma espécie de concordância dos grupos
indígenas e das demais populações tradicionais com o empreendimento”,
alerta.
O
precedente foi aberto em Belo Monte, conta o procurador. “Entraram nas
aldeias indígenas para fazer a comunicação do que seria a usina e como
ela afetaria essas populações”, explica. “Quando chegou no processo
judicial, isso foi apresentando como se fosse a consulta com os povos
indígenas e que essa etapa estaria cumprida. E aí foi a hora em que
interviemos e dissemos que não era consulta, porque não havia nem mesmo a
opinião dos índios nas atas das reuniões.”
Para
ganhar tempo, as empresas que fazem os serviços sondagem e perfuração
para os estudos de viabilidade da barragem se instalaram nos povoados
vizinhos a Pimental, onde a aceitação à hidrelétrica já é bem maior. Em
um deles, chamado São Luiz, nasceu o deputado federal Dudimar Paxiúba
(PSDB-PA).
Apesar
de pertencer ao principal partido de oposição ao governo federal, o
parlamentar defende um discurso pragmático e rejeita o radicalismo
contra a obra. “A princípio, eu gostaria que a hidrelétrica não viesse.
Mas tenho que pensar de forma racional. Vai prevalecer a vontade do
governo, que não vai abrir mão desse projeto”, discursa o deputado,
encontrado pela reportagem em visita a Pimental.
Nos
últimos meses, o parlamentar virou figurinha carimbada na beira do
Tapajós, participando de reuniões nas comunidades para falar justamente
das hidrelétricas. Na avaliação dos movimentos sociais, a intervenção
direta de Paxiúba vem amainando a resistência dos moradores de São Luiz,
que têm fé no ilustre filho da comunidade como mediador do conflito.
“Não somos nós que vamos ter o poder de paralisar esse projeto. Se ficar
no radicalismo, não teremos sequer como cobrar do governo uma
contrapartida”, explica o deputado.
Divergência
Em
Pimental, não há como negar que a recusa à hidrelétrica está longe de
ser unanimidade. E o clima esquenta a cada dia que passa. Em outubro, o
bate-boca entre os que apoiam e os que se opõem à usina de São Luiz do
Tapajós rendeu até ameaças de morte, registradas em um boletim de
ocorrência, contra o presidente da associação de moradores e um padre da
CPT que participa do movimento que resiste à barragem.
Pôr-do-sol na Vila de Pimental, município de Trairão (PA) / Foto: Fernanda Ligabue
Os
defensores da usina se apegam basicamente a três argumentos. O primeiro
é exemplarmente resumido na declaração de Ângela Maria Batista, nascida
e criada em Pimental: “É melhor a gente se unir com os grandes do que
se juntar com os pequenos para perder”. Desempregada, mãe de três filhos
e viúva, sem nem ter completado 30 anos, ela engatou um namoro
recentemente com um técnico de uma empresa que presta serviços para a
Eletrobras. E espera que o novo companheiro a leve embora de Pimental.
O
segundo argumento tem a ver com o inevitável – porém, temporário –
incremento da economia informal trazido pelos funcionários das firmas
que circulam pela vila de pescadores. Algumas famílias reforçam o
orçamento lavando uniformes ou fazendo marmitas. Aquelas com a sorte de
ter um de seus membros trabalhando nas empresas defendem com unhas e
dentes o dinheiro certo no fim do mês. E por isso preferem não levantar a
voz contra a barragem.
“Como
não tinham muito apoio, as firmas contrataram algumas pessoas para
trabalhar. É uma estratégia para dividir a comunidade”, rebate C.A.K.
Sem dúvidas, o plano de semear a discórdia tem dado resultado. “O que
tem de emprego em Pimental é na escola e no posto de saúde. A gente pede
a Deus para entrar uma firma aqui porque a situação é feia”, afirma
Ângela.
O
terceiro e último motivo de quem defende a construção da hidrelétrica
de São Luiz do Tapajós diz respeito à possível indenização que a
população afetada receberá. “Eu não tenho esse apego todo à comunidade.
Se me pagarem um valor bacana, eu saio. Eu até gostaria de ir para a
rua”, afirma Elba Sales, merendeira da escola de Pimental, referindo-se
à cidade de Itaituba.
Quando
perguntada se já parou para pensar sobre o valor considerado justo para
a indenização, Elba subitamente emudece. Rompido o silêncio, ela admite
com um sorriso amarelo que ainda não refletiu sobre o assunto. Elba
então conta que pagou R$ 5 mil na casa onde mora em Pimental. “Se lhe
dessem R$ 5 mil, a senhora sairia daqui?”, pergunta o jornalista. “Não,
da minha casa, não. Porque já apareceu quem queira comprar de volta e
nem por R$ 10 mil eu não dou.”
O que aguarda Itaituba
Atualmente,
se quisesse morar perto da orla do rio Tapajós, na parte mais agradável
da cidade de Itaituba, a merendeira da escola de Pimental teria de
desembolsar pelo menos R$ 1.800 de aluguel mensal num bom imóvel de três
quartos. Até dois anos atrás, o custo seria praticamente a metade
disso. Agora, se preferisse realizar o sonho da casa própria, comprando
um terreno de 250 metros quadrados no loteamento Novo Paraíso II,
localizado a 38 quarteirões de distância da avenida à beira-rio, ela
teria de desembolsar R$ 16 mil. A título de comparação, as vendas do
primeiro loteamento chamado Novo Paraíso foram encerradas em 2010. Cada
terreno foi negociado a R$ 3 mil.
Apesar
de as obras da hidrelétrica sequer terem sido licitadas, o mercado
imobiliário em Itaituba está explodindo. “A minha corretora tem um ano e
meio. Nesse período, já abriram mais três. E vão ser criadas outras
porque o pessoal está indo para fora estudar e fazer o curso de
corretagem”, analisa a empresária Ana Maria Gomes do Nascimento.
Ela
não tem dúvidas de que a escalada de preços está apenas começando. “Vai
aumentar mais, vai ficar como Altamira, vai ficar aquele aglomerado
mesmo e, daqui a pouquinho, qualquer quitinete está saindo a R$ 1 mil”,
avalia Ana Maria, comparando o futuro de Itaituba ao de Altamira,
município que abriga a hidrelétrica de Belo Monte e que inchou da noite
para o dia com as obras do maior empreendimento em curso no país.
Mas não é apenas o mercado de imóveis residenciais que se encontra em ponto de ebulição. Já antecipando oboom de
demanda que se desenha com a construção das hidrelétricas, o grupo
paranaense Gazin, que vende móveis e eletrodomésticos, acaba de
inaugurar uma grande loja no centro da cidade. Representantes de
empresas como a Sotreq, revendedora de tratores e máquinas pesadas da
norteamericana Caterpillar, também já viajaram a Itaituba à procura de
terrenos com ao menos 30 mil metros quadrados para futuras instalações.
Os locais mais cobiçados ficam na BR 230, a rodovia Transamazônica, que
corta o município.
Hoje,
Itaituba conta com uma população de aproximadamente 100 mil habitantes.
Segundo projeções do inventário da Eletronorte, apenas a hidrelétrica
de São Luiz do Tapajós deve atrair mais de 42 mil pessoas à procura de
trabalho para a região que tem o município como polo. Contando todas as
usinas previstas no Complexo Tapajós, a estimativa sobe para 130 mil.
Levando em conta outras obras de grande porte previstas para o futuro
próximo em Itaituba, como a construção de portos fluviais para
escoamento de grãos vindos, sobretudo, do Mato Grosso, a perspectiva de
que a população dobre nos próximos cinco anos não é nada exagerada.
“Itaituba
não está preparada para atender nem as pessoas que já vivem aqui”,
admite Eliene Nunes, prefeita eleita nas últimas eleições para
administrar o município nos próximos quatro anos. Não é preciso ser
especialista em urbanismo para detectar a calamidade pública em que a
cidade já se encontra. Em um rápido passeio pelos bairros da periferia é
fácil cruzar com fossas de esgoto a céu aberto que, em épocas de chuva,
alagam ruas e casas, causando todo tipo de doença. A rede de
eletricidade que abastece as residências também é precária. “Nós não
gostaríamos que Itaituba ficasse como Altamira”, afirma Eliene. A
prefeita eleita diz que até vem tentando estreitar o diálogo com a
Eletrobras, mas ainda não obteve nenhuma resposta por parte da estatal.
Periferia da cidade de Itaituba: deficiências na infraestrutura básica / Foto: Fernanda Ligabue
Em
entrevistas e pronunciamentos oficiais, os representantes da Eletrobras
têm aventado a possibilidade de construir a usina de São Luiz do
Tapajós em um sistema de “plataforma”, como as utilizadas pela Petrobras
na extração de petróleo em alto-mar. Essa seria uma alternativa para
minorar o inchamento da cidade, devido à chegada de um grande
contingente de trabalhadores. “Trata-se de um conceito ainda em
construção”, explica nota emitida pela assessoria de imprensa da
Eletrobras em resposta a questionamentos feitos pela Pública.
“As
usinas-plataforma serão um vetor de conservação ambiental, pois se
pretende que as intervenções em ambientes florestais sejam as menores
possíveis e, quando for necessária a intervenção, a premissa é que esses
ambientes sejam recompostos (reflorestamento). Também não haverá a
construção de vilas de operários no entorno da usina como foi feito nos
empreendimentos hidrelétricos do resto do país”, prossegue a nota.
A
assessoria de imprensa da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel),
que fiscaliza a atividade das hidrelétricas no país, também defende a
iniciativa. “Essas plataformas representam um boa alternativa, pois
seriam instalações provisórias durante a obra e, na fase de
funcionamento, haveria acesso apenas para os operacionais, não havendo a
criação das tradicionais vilas de operários e, assim, evitando a
criação dos núcleos populacionais que impactam as regiões”, sustenta a
nota da assessoria de comunicação.
Especialistas ouvidos pela Pública duvidam
do sucesso dessas plataformas para mitigar os impactos. “Estamos
falando de 20 mil pessoas. Não de 20 ou 30 trabalhadores. Inicialmente,
quando lançaram a ideia de usina-plataforma, disseram até que os
operários seriam transportados por helicóptero, o que é um absurdo. É
pirotecnia pura, é jogar uma série de coisas para a sociedade engolir”,
critica Wilson Cabral, professor e pesquisador do Instituto Tecnológico
de Aeronáutica (ITA).
Para
o engenheiro Arsênio Oswaldo Sevá Filho, professor da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), por trás da suposta sustentabilidade
apregoada pelo conceito de usina-plataforma, camufla-se um objetivo
perverso: a militarização dos canteiros de obras. “Isso já aconteceu nas
hidrelétricas do Madeira. Eles cercaram as áreas com milícias privadas
das empreiteiras. Em Belo Monte, já estão colocando o exército na área,
além da Força Nacional, que chegou lá em 2009 para as audiências
públicas e nunca mais saiu”, explica.
No
caso específico do Tapajós, além de intensificar o controle sobre os
trabalhadores a fim de debelar possíveis greves e manifestações, a
militarização se justifica por outro motivo bastante convincente: a
enorme presença de ouro no entorno de Itaituba, tomado por mais de 2 mil
garimpos clandestinos.
“O
planejamento de construir diversas hidrelétricas numa região onde todo
mundo está atrás de ouro não pode ser analisado como se a atividade-fim
fosse apenas a produção de energia elétrica”, sugere Sevá. Para o
professor, é inevitável que, ao revolver o solo do Tapajós para fazer as
fundações das hidrelétricas, as empresas também considerem a
viabilidade de extrair o mais valioso dos metais.
Os indígenas que não existiam (para a Eletrobras)
Quando
o repórter anuncia o fim da entrevista, Deusiano faz um último pedido
antes de a câmera ser desligada: cantar o hino de guerra da sua etnia na
língua materna munduruku. Enquanto olha fixamente a lente do
equipamento do homem branco que captura sua imagem e sua voz, ele parece
mandar um recado por meio da letra da canção. Em resumo, ela passa a
mensagem de que os Munduruku jamais se intimidarão diante da luta.
Deusiano
e seus parentes vivem na aldeia Sawré Muybu, nas margens do Tapajós.
Para chegar até lá, é necessário vencer as duas horas de estrada que
separam o centro de Itaituba do porto do Buburé, localizado no Parque
Nacional da Amazônia, uma das mais antigas unidades de conservação
ambiental da Amazônia, criada em 1974 pelo governo militar como
compensação aos impactos gerados pela abertura da Transamazônica.
Os
indígenas da Sawré Muybu estão encurralados. De um lado, a ameaça vem
do Chapéu do Sol, um dos maiores garimpos de ouro e diamante da região,
que despeja quantidade significativa de mercúrio nas águas do rio. De
outro, a preocupação é com o lago de 722 quilômetros quadrados – área de
quase 75 mil campos de futebol – que será formado com a construção da
hidrelétrica de São Luiz do Tapajós. “Se a usina sair, nossa terra não
vai ser totalmente inundada, mas vamos ficar ilhados, sem a caça e sem a
pesca”, afirma Juarez, cacique da aldeia.
Há
anos, os Munduruku da aldeia Sawré Muybu lutam para que a área seja
demarcada. Em 2007, a Fundação Nacional do Índio (Funai) até criou um
grupo de trabalho para iniciar o processo. Porém, a profissional
responsável pela produção do relatório antropológico sumiu sem deixar
vestígios – segundo a própria Funai. Desde então, o pleito dos indígenas
estava esquecido nas gavetas da burocracia federal – até o momento em
que eles entraram em rota de colisão com a usina de São Luiz do Tapajós.
Indígenas do povo mundurukus pintados para a guerra com jenipapo e carvão / Foto: Fernanda Ligabue
Ao
longo de 2012, técnicos das empresas que fazem os estudos de
viabilidade da hidrelétrica entraram em diversas oportunidades – e sem
qualquer tipo de comunicação prévia – na área da aldeia, abrindo picadas
e colocando marcos na mata. A postura invasiva revoltou os Munduruku.
“Não vamos mais deixar ninguém entrar na nossa casa”, avisa Juarez.
A
Funai de Brasília foi escalada pelo governo federal para mediar o
conflito e tentar convencer os Munduruku a liberar a entrada dos
técnicos. Numa tensa reunião realizada em 17 de outubro, uma
representante da Funai ameaçou até convocar a Força Nacional para
escoltar os técnicos, caso os Munduruku resistissem. De qualquer
maneira, o fato é que a pressão dos indígenas da Sawré Muybu surtiu
efeito: no último dia 31 de outubro, o Diário Oficial da União publicou
a portaria para a retomada dos trabalhos de identificação e delimitação da área.
Aparentemente,
o governo federal parece se abrir ao diálogo com os indígenas na zona
de influência da usina de São Luiz do Tapajós. Mas nem sempre foi assim.
No portal do Ibama na internet, é possível acessar documentos sobre o
licenciamento ambiental de empreendimentos em curso em todo o país.
Quando se abre aficha que
resume as informações do processo da hidrelétrica de São Luiz do
Tapajós, lê-se o seguinte texto na penúltima das cinco páginas:
“Presença de terras indígenas nas área afetadas: sem informação”.
Segundo
a Funai, além da Sawré Muybu, existem outras cinco terras indígenas
ocupadas pelos Munduruku na área de influência direta da usina de São
Luiz do Tapajós. Esse fato chegou a ser comunicado à diretora de
Licenciamento Ambiental do Ibama por meio de um ofício que
data de 17 de fevereiro deste ano. No documento, a Funai informava
inclusive que, das seis terras indígenas, duas se encontravam em
processo de demarcação.
Exatamente
uma semana após o envio desse ofício, o Ibama autorizou a Eletrobras a
abrir picadas na mata e a coletar material da floresta para a realização
do estudo impacto ambiental, inclusive na área da Sawré Muybu. E foi aí
que começaram os conflitos. “Mais de cem pesquisadores estão circulando
pelo Tapajós, sem levar esclarecimento às populações locais. É natural
essa reação de resistência”, afirma a Juliana Araújo, chefe do serviço
de monitoramento territorial do escritório da Funai em Itaituba, que
mantém contato direto com a aldeia Sawré Muybu.
Em
novembro, a Justiça Federal suspendeu, em primeira instância, o
licenciamento da hidrelétrica de São Luiz do Tapajós atendendo a uma Ação Civil Pública (ACP)
movida pelo gabinete do Ministério Público Federal (MPF) de Santarém
(PA). Um dos principais motivos que embasa o pedido é justamente a não
realização de uma consulta prévia com as populações indígenas
diretamente afetadas pelo empreendimento, como mandam não só a
Constituição Federal de 1988, mas também a Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil.
“A
Eletrobras e o Ibama tinham conhecimento do ofício da Funai, sabiam que
havia terras indígenas na área de influência da hidrelétrica de São
Luiz do Tapajós, mas mesmo assim passaram por cima dessa informação”,
acusa o procurador Fernando Antônio Oliveira Júnior, um dos autores da
ação.
Ele
faz questão de ressaltar que a consulta prévia não se resume a um mero
aviso: é preciso explicar de forma clara e acessível, de modo que os
indígenas compreendam plenamente as características do projeto. “A
Convenção 169 da OIT é ainda mais cuidadosa e protetiva do que a
Constituição de 1988. Ela diz que a consulta prévia tem que ser
realizada antes de qualquer tipo de autorização. É um dos primeiro
passos para a construção do empreendimento”, acrescenta o procurador.
O
tratamento dispensado às comunidades indígenas no caso da usina de São
Luiz do Tapajós é sintomático do que está por vir. O governo federal vem
montando um trator jurídico para viabilizar não só o complexo
hidrelétrico do Tapajós, mas outros grandes empreendimentos na Amazônia.
Exemplo disso é a discussão em curso no Congresso Nacional sobre a
reforma do Código de Mineração, que pretende regulamentar a atividade em
territórios indígenas.
Em julho deste ano, a Advocacia Geral da União (AGU) publicou a Portaria 303.
Na prática, além de dificultar a ampliação das terras indígenas no
país, a medida abre brechas para que o governo e a iniciativa privada
construam hidrelétricas, rodovias e outros grandes projetos
“independentemente de consulta às comunidades indígenas”. A portaria
despertou críticas ferozes por parte dos movimentos sociais e já teve
sua constitucionalidade questionada no Supremo Tribunal Federal (STF)
pelo MPF. Como se vê, a indiferença com os indígenas atingidos pela
usina de São Luiz do Tapajós é apenas a ponta do iceberg.
Ao analisar que as tarifas estão chegando ao patamar dos R$ 3 para
cada viagem (ou conjunto de viagens, no caso de São Paulo), é bom saber
que existem exemplos que desafiam a lógica que impera no Brasil
O tema do valor do transporte público é sempre sensível nas cidades
brasileiras. A cada aumento de tarifa, vozes se levantam para cobrar um
subsídio maior para o uso de ônibus e trens. A resposta das prefeituras e
governos estaduais é sempre a mesma: alguém tem de pagar pelo sistema,
cujos custos sempre aumentam. Mas essa discussão chegou em outro nível
em várias cidades nos Estados Unidos e Europa. Nelas, os moradores não
pagam para usar o transporte coletivo. Entre elas estão Châteauroux,
Vitré e Compiègne, na França; Hasselt, na Bélgica; Lubben, na Alemanha e
Island County, Chapel Hill, Vail e Commerce, nos Estados Unidos, entre
outras. A próxima a adotar a ideia será Tallinn, a capital da Estônia,
no final deste ano.
Conceito de transporte público gratuito e de qualidade está sendo implementado em diversas cidades do mundo.
A ideia de gratuidade no transporte vai contra tudo o que nos
disseram sobre o assunto aqui no Brasil, a saber: sem pagamento, o
sistema ficaria sem recursos, e em algum momento se tornaria inviável.
Mas existem teóricos e administradores públicos que defendem que é
economicamente viável – ou até preferível – que as pessoas não paguem
por ele.
As vantagens de não se cobrar pelo uso de trens e ônibus são várias:
promoção de uma certa justiça social, já que o peso do pagamento de
transporte público é grande para a população mais pobre, que é a que
mais precisa dele; redução da emissão de poluentes; menos poluição
sonora; redução do uso de combustíveis fósseis; diminuição dos gastos em
obras viárias, já que o carro seria menos necessário; aumento do uso do
espaço público, pois as pessoas precisariam andar mais nas ruas para
usar o transporte; eliminação dos gastos com o sistema de cobrança,
entre outras.
Em Châteauroux, cidade de 49 mil habitantes, a média de uso do ônibus
era de 21 viagens por ano, contra uma média de 38 em outras cidades
pequenas da França. Depois da implementação da gratuidade, esse número
saltou para 61 viagens por ano. Em Hasselt, o uso do transporte público
subiu mais de 1000% desde que passou a ser gratuito.
O aumento no número de usuários é um dos indicadores para o sucesso
do sistema, pois significa que as pessoas trocaram de meio de
transporte: se deixaram o carro, contribuíram para a diminuição do
trânsito, e se de outra forma teriam ido a pé ou de bicicleta, ajudaram a
reduzir os riscos de acidentes como atropelamentos, diminuindo ainda
mais o gasto com os carros (nesse caso, os custos de acidentes desse
tipo entram na conta do transporte individual motorizado).
Os teóricos do transporte gratuito dizem ainda que, a cada aumento de
tarifa, existe uma diminuição no número de usuários, que passam a não
poder pagar ou encontram uma alternativa economicamente mais viável para
se locomover. Isso diminuiu ou até anula o aumento da arrecadação
esperado com o aumento da tarifa, fazendo com que o sistema fique cada
vez menos viável, já que menos pessoas têm de pagar mais para as mesmas
viagens.
Outro motivo econômico importante para a abolição das tarifas é que o
sistema de cobrança custa muito dinheiro. Um estudo patrocinado pela
Administração Federal de Transportes dos Estados Unidos mostrou que os
gastos com o sistema de cobrança pode chegar a 20% de toda a renda com o
pagamento de tarifas. Isso inclui gastos com máquinas de vendas,
pessoal, contagem do dinheiro coletado e custos afins.
Mas quem paga por isso, afinal?
Embora os sistemas de financiamento variem um pouco de cidade para
cidade, o princípio é sempre o mesmo. O transporte público é bancado por
impostos. Em Hasselt, na Bélgica, 1% dos impostos municipais vai para o
sistema de ônibus. No condado de Island, Washington, 6% do dinheiro
arrecadado com o imposto sobre vendas vai para o transporte público. Em
Châteauroux, os recursos vêm dos impostos sobre os salários, pagos pelos
empregadores. As possibilidades são variadas.
Financiar o sistema de transporte com impostos pode parecer uma
ideia, digamos assim, muito comunista. Mas por que faz mais sentido
pagar desse modo por saúde, educação e, pior, construção de ruas e
avenidas para os carros? Por uma questão de justiça social, o transporte
público também poderia ser incluído no rol de serviços custeados por
impostos. Afinal, quem não anda de transporte público, especialmente no
Brasil e nos Estados Unidos, acaba escolhendo carro ou moto para se
locomover, aumentando custos de obras, da saúde, da limpeza pública,
entre outros, além de contribuir para a emissão de poluentes. Há aqueles
que não têm outra alternativa senão andar, e esses seriam os maiores
beneficiados.
O segredo para o sucesso da gratuidade nas cidades citadas – e até
agora todas elas se consideram casos de sucesso – é o planejamento
anterior. Algumas delas fizeram investimentos maciços no transporte
público antes de abolir as tarifas, para tornar o sistema atraente para
um maior número de pessoas.
A grande questão que fica é se isso seria aplicável no Brasil. Isso
depende de estudos aprofundados, que só podem ser feitos individualmente
em cada cidade. Nas metrópoles, por exemplo, os sistemas de transportes
já são tão lotados que qualquer ideia nesse sentido teria de ser
precedida por um aumento massivo na oferta de ônibus e transporte sobre
trilhos. É mais provável, no entanto, que seja um conceito inaplicável
em grandes cidades, restando a ideia de maior subsídio ao sistema. Em
cidade menores, talvez esse conceito seja mais facilmente aplicável.
Mas, ao analisar que as tarifas estão chegando ao patamar dos R$ 3 para
cada viagem (ou conjunto de viagens, no caso de São Paulo), é bom saber
que existem exemplos que desafiam a lógica que impera por aqui. Resta
saber qual seria a popularidade dessas ideias entre administradores
públicos, empresários do setor de transporte e contribuintes que acham
que não seriam beneficiados com a medida.